quinta-feira, 16 de julho de 2015

A Legitimidade do Senhor Dom Miguel I ao Trono de Portugal.

Golpe de Vista, em que compendio, mas em luz clara, e brilhante se propoem as razões, e fundamentos, que demonstrão, a ponto de evidencia, a Legitimidade dos Direitos d'ElRei o Senhor Dom Miguel I. Ao Throno de Portugal..., em 10 de Março de 1829. [Obra atribuída a Frei Fortunato de S. Boaventura].

(...)
Todas as razões, ou fundamentos dos Direitos do Senhor D. Miguel ao Throno de Portugal podem commodamente, para sem dificuldade se perceberem em hum ponto de vista, reduzirem-se a duas classes: Primeira, das que demonstrão com evidencia a justiça da exclusão do Senhor D. Pedro, seu irmão mais velho, da Sucessão ao mesmo Throno. Segunda, das que demonstrão em igual evidencia a legitimidade da Accessão do Senhor D. Miguel aquella Sucessão pela exclusão do Senhor D. Pedro. As razões, ou fundamentos da 1ª classe também se podem reduzir a seis e as da 2ª classe a outras seis; mas as seis da 1ª classe acrescentarei mais três, menos decisivas, mas subsidiárias, e de grave reforço.



1ª PARTE

Em 1ª classe = Razões, que decidem incontestavelmente a exclusão do Senhor D. Pedro, não obstante a sua naturalidade, e Primogenitura.

O Senhor D. Pedro, bem que nascido em Portugal, e primogénito do Senhor Rei D. João VI, perdeo os Direitos, que huma, e outra qualidade lhe davão á Coroa de Portugal.

1º Porque muito por seu querer e escolha se fez Estrangeiro a Portugal, passando a ser Soberano independente, e Imperador do Brasil, tendo-se por isso desligado este absolutamente de Portugal.

2º Porque o Senhor D. Pedro, Filho, e Vassallo do Senhor D. João VI Rei de Portugal, não só aprovou, e favoreceo a Rebellião do Brasil, mas se apresentou á testa dos Rebeldes, e Revolucionários, como seu Chefe; desmembrou do Reino de Portugal aquella importantíssima Colónia, elevada por seu Pai á qualidade de Reino; e até se declarou a si próprio solemnemente perpetuo Defensor do paiz rebellado.

3º Porque os Senhor D. Pedro, além de separar da Mãi Pátria aquelle Estado, fez declarada guerra offensiva a Portugal, sua Patria; e tudo isto para sustentar a Rebellião do Brasil, e a desmembração, e usurpação de huma dos mais interessantes, e consideraveis Dominios de Portugal.

4º Porque o Senhor D. Pedro propoz-se, empenhou-se, e fez quanto em si estava, para por meio da sua Carta Constitucional, que mandou jurar em Portugal, desmanchar, e destruir arbitrariamente as Leis fundamentais deste Reino, e o que havia de mais venerável em suas Instituições, assim pela sua antiguidade, e inalterável observância, como pelas suas vantajosas, e experimentadas utilidades.

5º Porque o Senhor D. Pedro, como Imperador do Brasil, se obrigou a residir sempre no Brasil, e não pode vir residir em Portugal; residência esta absolutamente indispensável para poder succeder na Coroa de Portugal.

6º Porque o Senhor D. Pedro mesmo positiva, e expressissimamente declarou que nada queria de Portugal, e até reconheceo mui solenemente que, sendo Imperador do Brasil, não podia ser Rei de Portugal.

Accrescem porém ainda sobre tudo isto tres razões subsidiarias, que não devem ficar em silencio.  1ª O Senhor D. Pedro nem em Portugal, nem no Brasil foi acclamado Rei de Portugal.

2ª O Senhor D. Pedro não... prestou o Juramento de guardar aos Portuguezes seus Privilégios, Liberdades, Foros, graças e costumes, que as Leis Fundamentais da Monarchia mandão que os Reis de Portugal prestem antes de serem levantados Reis, e antes que os Estados do Reino lhe prestem o Juramento de preito, e homenagem.

3ª Ainda no caso de se poder suppôr legitimada pelo Senhor Rei D. João VI no Tratado de 29 de Agosto de 1825 a usurpação, e levantamento do Brasil em Império independente: caso puramente ideal, e de mera supposição, esse caso seria justamente o que previrão as Côrtes de Lisboa de 1641, dizendo: que se acontecer succeder o Rei deste Reino em algum Reino, ou Senhorio maior... e tendo dous, ou mais filhos varões, o maior succeda no Reino estranho, e o segundo neste de Portugal; e este seja jurado Príncipe, e Legitimo Sucessor..."   2ª PARTE

E 2ª classe de razões, ou argumentos. Razões que demonstrão em evidencia a legitimidade da Accessão do Senhor D. Miguel à Successão da Corôa de Portugal, pela exclusão do Senhor D. Pedro.
O Senhor D. Miguel tem legitimo, e rigoroso direito á Corôa de Portugal

1º Porque excluido justamente della o Senhor D. Pedro por tantas, e tão incontrastaveis razões, que ficão ponderadas, elle he o Filho segundo vivo (a) do Senhor Rei D. João VI, e o irmão immediato do Senhor D. Pedro, em quem a mesma Corôa pelas Leis fundamentaes da Monarchia (b) necessariamente recahe.

2º Porque o Senhor D. Miguel não só nasceo, e foi creado em Portugal, como expressamente requerem as Côrtes de Lisboa de 1641; mas nunca perdeo, nem de facto, nem de Direito (c), os direitos da sua naturalidade, nem os renunciou expressa, ou tacitamente, naturalisando-se em Paiz estranho, fazendo-se Estrangeiro.

3º Porque o Senhor D. Miguel aos direitos da sua naturalidade, e immediata Successão, como segunda Linha reune o da sua residencia actual, firme, e permanente em Portugal, sem se achar ligado por vinculo algum a outra residencia fora delle, e por isso por felicidade deste até aqui desafortunado Reino, não ha, nem pode haver a mais leve desconfiança de que este seu verdadeiro Libertador, e Restaurador (d) jámais o deixe, e abandone.

4º Porque assim a exclusão do Senhor D. Pedro da Corôa de Portugal, como todos os indicados Direitos do Senhor D. Miguel, depois do mais exacto exame, e discussão forão reconhecidos, e declarados legitimos, e indubitaveis do modo o mais unanime (e) e solemne pelas Côrtes verdadeiramente Portuguezas de Lisboa de 11 de Julho de 1828 pelos tres Braços, ou Estados do Reino, Clero, Nobreza e Povo, de cuja privativa competencia he toda a que tem sobre a Successão do Reino (f).

5º Porque o Senhor D. Miguel se tem exactamente preenchido todas as Solemnidades, que as Leis fundamentaes de Portugal requerem para a legitima exaltação de seus Soberanos ao Throno, além das que se apontão na razão antecedente, o Senhor D. Miguel nas sobredictas Côrtes de Lisboa de 1828 prestou o Juramento de Reger, e Governar bem, e direitamente o Povo Portuguez, de administrar-lhe Justiça, e de lhe guardar seus Bens, Foros, Privilégios, Liberdades, e bons costume; e em consequencia tambem os tres Braços, ou Estados do Reino alli reunidos, lhe prestárão ao mesmo o Juramento de preito, e homenagem (g).

6º E ultimamente porque o Senhor D. Miguel sobre legitimos, e rigorosos direitos, e legaes Solemnidades da Posse effectiva, em que está da Corôa de Portugal, Posse, que desde o feliz dia de 22 de Fevereiro de 1828, em que entrou neste Reino, na sua volta de Vienna d'Austria, lhe foi logo dada pela espntanea, e geral Acclamação do Povo Portuguez (h) quatro mezes antes da Celebração das Côrtes, e do Reconhecimento, e Declaração, que ellas fizerão da Justiça, e legitimidade daquelles mesmo Direitos, os quaes independentemente de tal Reconhecimento, e Declaração per si evidentes e incontestaveis (i); Posse, e Acclamação, que depois das Côrtes os Portuguezes não tem cessado de repetir, e confirmar com o maior entusiasmo, mostrando verbal, e praticamente (j) com os testemunhos mais decisivos, e com os sacrificios mais difficeis, e penosos que se felicitão de terem o Senhor D. Miguel I por Soberano, que, ainda que por Direito o não fosse, o querião por escolha, e não querem outro algum Rei, e Soberano.



"Golpe de Vista", em 10 de Março de 1829. [Obra atribuída a Frei Fortunato de S. Boaventura].

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